INFORMAÇÃO E AÇÃO MORAL NO CONTEXTO DAS  NOVAS TECNOLOGIAS


Rafael Capurro

 

 
Contribuicâo ao VII Encontro Internacional de Informação, Conhecimento e Ação, Universidade Estadual Paulista (UNESP),  Marília (sâo Paulo, Brasil), 31out.-3nov. 2011. (Trad. del castellano por Mariana Cláudia Broens, UNESP, Marilia) (Trad. al alemão). In: Maria Eunice Quilici Gonzalez, Mariana Clauda Broens, Clélia Aparecida Martins (Org.): Informacâo, Conhecimento e Acâo Ética. Universidade Estadual Paulista, Marilia 2012, 37-54 (pdf).

Cristian Berrío Zapata, Ricardo César Gonçalves Sant’Ana: Ação moral e ontologia digital na América Latina: considerações a partir do pensamento de Rafael Capurro. In: Liinc, 2015.



 

Introdução


O título deste trabalho se refere a uma relação aparentemente evidente entre informação e ação moral, se se entende por esta última uma ação fundamentada e, por isso, responsável. Uma ação não fundamentada, isto é, não informada ou mal informada, é uma ação irresponsável e, portanto, imoral. Isso significa, então, que em um mundo no qual a informação é extremamente copiosa graças às tecnologias da comunicação não pode haver, em princípio, uma ação irresponsável a não ser que o agente intencionalmente se recuse a ser informado. Todo agente capaz de refletir sobre as consequências de seus atos, como é o caso dos agentes humanos, tem a responsabilidade moral de estar bem informado.

As tecnologías da comunicação são o auge do sonho do iluminismo que concebia a ação moral fundamentada na autonomia informada do sujeito, Daí sua luta contra a censura, tanto política quanto religiosa, e sua ambição de espalhar a memória do saber humano depositada em bibliotecas e enciclopédias a todos os cidadãos, para além das diferenças econômicas ou sociais.

A rede digital que denominamos “Internet” torna possível hoje o acesso universal ao saber, superando, além disso, os condicionamentos espaciotemporais do livro e as instituições nele baseadas. Mais ainda, a rede digital permite não apenas o acesso ao saber exteriorizado, mas é também uma rede de comunicação interativa com valor agregado ao mero processo informativo.

A ação moralmente responsável pode basear-se, então, não apenas na informação de um sujeito autônomo, mas também na possibilidade de comunicar-se com outros agentes. Entre eles estão incluídos frequentemente os produtores daquela informação que o agente toma como fundamento de sua ação a fim de comprovar si o outro/outros também compartilham sua interpretação da informação e de sua relevância e aplicação ao caso em questão.

As tecnologias da comunicação possibilitam um diálogo crítico que permite ao sujeito moral não apenas informar-se, mas também refletir com outros sujeitos. Isto apenas se o referido agente, individual ou coletivo, esteja aberto à crítica e disposto a modificar sua opinião se os argumentos alheios lhe parecem mais convincentes do que os próprios.

Este diálogo pode tanto referir-se à própria informação quanto aos preconceitos do agente que frequentemente podem ser percebidos como tais a partir de uma perspectiva externa. Se este raciocinio é correto, podemos acreditar que vivemos ou, melhor dizendo, que deveríamos viver em um mundo no qual a ação moralmente responsável  tem atualmente ótimas condições de se concretizar.

No entanto, esta visão esquemática da relação entre informação, ação moral e tecnologias da comunicação se confronta com um mundo complexo em relação às próprias tecnologias da comunicação, sua distribuição e acesso desiguais, que pode ser designada brecha digital, e em relação ao problema da seleção da informação mediatizada por ferramentas de busca e à infinidade de fontes acessíveis na rede digital com diferentes graus de credibilidade e seriedade. Mas o problema é de fundo. As tecnologias da comunicação, como a tecnologia em geral, não são neutras, isto é, não são um mero instrumento de que se serve um sujeito, individual ou coletivo, para agir no mundo, mas elas transformam a natureza mesma da relação entre o sujeito e o mundo e, por conseguinte, a própria auto-compreensão do agente moral humano. Assim, as perguntas que se colocam são: Em que consiste a referida transformação no caso das tecnologias da comunicação? Que consequências traz a referida transformação para o agir moral humano?

Na primeira parte deste ensaio quero mostrar, a título de exemplo, como e com quais implicações uma análise atual da filosofia política e social como é o caso da recente publicação “O direito da liberdade” de Axel Honneth, 2011, discípulo de Jürgen Habermas, acredita poder abrir mão quase completamente das novas tecnologias da comunicação, perdendo de vista a transformação da autocompreensão humana, em geral, e da ação moral, em especial, que ditas tecnologias provocam.

Na segunda parte, mostrarei brevemente em que consiste, em minha opinião, dita transformação do agir humano e qual é a tarefa de uma reflexão ética da informação quando pensamos hoje sobre o agir humano no horizonte da comunicação digital.

 

O direito à liberdade segundo Axel Honneth

A antropologia filosófica busca uma resposta à pregunta “o que é o ser humano?”, na qual se resumem, segundo Kant, as perguntas “O que posso conhecer?”, “O que devo fazer?” e “O que posso esperar?”. A tais perguntas oferecem respostas, respectivamente, a metafísica, a moral e a religião (Kant, 1975, A25, p. 448). A filosofia kantiana distingue claramente entre o ser humano pensado como pessoa com autonomia moral e todos os demais entes mundanos. A pregunta “O que é um ser humano?” refere-se, embora implicitamente, não a um “que”, mas a um “quem”. Chamo a diferença entre “que” e “quem” uma diferença moral. A ação moral é aquela que se estabelece com base num mútuo reconhecimento entre pessoas que compartilham um mundo comum. Kant distingue entre o ser humano como ser natural (homo phaenomenon) e o ser moral (homo noumenon), o qual é membro do “reino dos fins” (“Reich der Zwecke”) ao qual pertencem outros entes noumenais (Kant 1977, A 65, p. 550).

Para Kant, o conceito de sujeito como “eu” tem, portanto, um duplo significado: de um lado, o “eu” faz parte do mundo empírico e, de outro, é membro do mundo noumenal, sem que este último, o sujeito moral propriamente dito, possa ser conhecido objetivamente pela razão teórica.

O dualismo kantiano foi questionado pelo idealismo alemão e, em particular, por Hegel, quem descreve em a “Fenomenologia do espírito” a dialética entre identidade e diferença no processo de geração do mundo social moral ou da “eticidade” (“Sittlichkeit”) com suas instituições (família, sociedade civil, Estado) que se forma na luta (“Kampf”) pelo mútuo reconhecimento das autoconsciências do amo e do escravo (Hegel, 1975). Esta tradição, transformada por Karl Marx, é retomada na teoria crítica da Escola de Frankfurt por pensadores como Max Horkheimer, Theodor W. Adorno e Jürgen Habermas assim como por seu aluno e sucessor, Axel Honneth.

Este último apresenta em sua obra “Luta pelo reconhecimento” o nascimento e fundamento do estado de direito como um processo no qual os sujeitos autônomos se reconhecem mutuamente como livres e capazes de atribuir-se leis universais ou universalizáveis às quais se submetem livremente sem que isso elimine o problema das diferentes identidades que dão lugar à referida luta (Honneth 1994).

Em obra recentemente lançada que tem por título “O direito da liberdade. Compendio de uma eticidade democrática” Honneth indica que a eticidade (“Sittlichkeit”) está alicerçada em valores fundamentais entre os quais “a liberdade no sentido da autonomia individual” é o mais importante na sociedade moderna (Honneth 2011, p. 35 tradução nossa).[1] A ideia de autonomia ou autodeterminação é nó em que se articula a relação entre a justiça social e os interesses individuais: não há justiça social se não há respeito universal à autonomia do sujeito, a qual, podemos concluir, é o núcleo de sua identidade pessoal.

Honeth retoma o conceito kantiano de autonomía situando-o no marco da intersubjetividade como o fizeram antes dele Karl-Otto Apel e Jürgen Habermas com os conceitos de “comunidade de comunicação” e “ação comunicativa”. Para Honeth, tanto o “eu” quanto o “nós” fundamentam sua autodeterminação “na realidade social das relações institucionais” (Honneth 2011, p. 70 tradução nossa).

Em outras palavras, a identidade do sujeito não é algo dado, mas um produto de processos sociais informacionais nos se insere o que Honeth chama “liberdade social” (“soziale Freiheit”). Segundo Honneth, esta liberdade social vai além das ideias liberais e individualistas de autorealização subjetiva que se expressam na “liberdade reflexiva”. Esta última pensa a autonomia sem nenhum tipo de dependência frente à realidade social que a possibilita enquanto que para Honneth, na esteira de Hegel, a autonomia do sujeito não é pensável sem uma relação aberta a uma pluralidade de sujeitos.

A linguagem é, tanto para Hegel quanto para Honeth, o meio que permite aos indivíduos expressar-se buscando um mútuo reconhecimento. Apenas agentes capazes de expressar e respeitar mutuamente seus desejos, necessidades e objetivos podem se associar livremente em instituições com regras comuns de comportamento ("normierter Verhaltenspraktiken"), criando assim uma eticidade (Honneth, 2011, p. 86 tradução nossa). A ação moral assim entendida está essencialmente relacionada com um processo informacional de compreensão e regulação livre e mútua. Com esta tese, Honneth, seguindo Hegel e Marx, coloca-se ao lado de uma “versão forte” da “essência da liberdade”, segundo a qual não basta afirmar que a liberdade tem um fundamento social, e defende a “versão fraca”, mas que o “requisito ontológico forte” implica o confronto de um sujeito autônomo com a “realidade objetiva” de uma pluralidade de “co-sujeitos” também autônomos com seus desejos e interesses próprios (Honneth, 2011, p. 91 tradução nossa).

As normas e instituições sociais estão, por tanto, precedidas por relações de autoreconhecimento mútuo. O resultado não é um sistema social absoluto e definitivo, mas um sistema baseado em práticas e hábitos ou costumes relativamente estáveis (Honneth, 2011, p. 92). Honneth coloca, assim, a base do que eu denomino ética intercultural da informação, isto é, um diálogo intercultural sobre normas, valores e costumes que possam reger de forma mais ou menos estável os processos comunicacionais de uma sociedade assim como as relações entre indivíduos, sociedades, estados e culturas na rede digital global (Capurro, 2008). Não é por acaso que no momento em que surge uma nova tecnologia comunicacional os valores e costumes locais vigentes entram em crise cedo ou tarde, dando lugar ao referido discurso ético global. Honneth descreve as formas de “liberdade social”, a saber, o “nós” das relações pessoais (amizade, relações íntimas, famílias), o “nós” da atividade econômica (mercado, esfera de consumo, mercado de trabalho) e o “nós” do processo democrático da formação de uma vontade comum (a esfera pública democrática, o estado de direito democrático, a cultura política).

Embora Honneth seja consciente da importância da “tecnologia dos meios” e de “espaços de comunicação política” para o desenvolvimento da “publicidade política”, sendo este um processo que se desencadeia especialmente a partir da Revolução Francesa (Honneth, 2011, p. 487 tradução nossa), é preciso notar que durante sua minuciosa análise da realidade social e de seus condicionamentos institucionais e normativos, Honneth não faz quase nenhuma referência às mudanças produzidas pelas tecnologias digitais de comunicação. Em outras palavras, para Honneth as referidas tecnologias não realizam uma mudança fundamental na autocompreensão humana e na ação moral, em especial no que diz respeito à “liberdade social” e à “publicidade democrática”, pelo menos não na medida em que o fizeram a imprensa e os meios de comunicação de massa do século XX, especialmente o rádio e a televisão. Isto fica claro não apenas nas poucas páginas que Honneth dedica à internet no fim de sua obra, mas também na quase total ausência de problematização do papel da internet nas relações pessoais (amizade, relações íntimas, famílias), no “nós” da atividade econômica e até certo ponto no “nós” do processo democrático.

Apenas no final do libro se refere Honneth à internet como um instrumento para a construção de grupos de comunicação transnacionais ("transnationale Kommunikationsgemeinschaften") (Honneth, 2011, p. 565 tradução nossa), longe, portanto, de concebê-la como o meio onde a “liberdade social” se expressa de forma nova em todas suas dimensões e com todas as ambiguidades próprias do agir comunicacional humano. (Honneth, 2011, p. 560-561 tradução nossa)  escreve que a internet:

[…] permite a cada indivíduo, em sua existência física isolada frente ao computador, comunicar-se instantaneamente com um grupo de pessoas em todo o mundo, cujo número está limitado apenas por sua capacidade de elaboração e o espaço de sua atenção.

Entendo que esta é uma visão muito parcial da comunicação digital como a vivencia atualmente a maior parte das sociedades contemporâneas. Justamente o que não se dá em primeiro lugar são indivíduos isolados diante de um computador comunicando-se com um grande grupo de pessoas. Honneth pensa aqui em categorias dos meios de comunicação de massa em que um emissor se conecta com um grande grupo de pessoas. Curiosamente, indica o autor que tanto em Hannah Arendt quanto em Jürgen Habermas se pode constatar uma quase total ausência dos meios de comunicação e que, quando se referem a eles, trata-se geralmente de uma valoração negativa (Honneth, 2011, p. 523 tradução nossa).

Para ambos, a “mudança estrutural da publicidade” (“Strukturwandel der Öffentlichkeit” J. Habermas) que os meios de comunicação de massa trazem consigo significa um processo de "reprivatização do espaço público" ("Reprivatisierung der politischen Öffentlichkeit") (Honneth, 2011, p. 523 tradução nossa). Se Arendt e Habermas são “filhos do livro”, a socialização de Honneth está baseada nos meios de comunicação de massa, indicando, como já fazia Habermas, tendências que também ele considera como negativas, a saber, a privatização da produção comunicacional e a indústria publicitária. (Honneth, 2011, p. 542 tradução nossa). Paradoxalmente, no momento em que Honneth afirma que a recepção da informação através dos meios de comunicação de massa não é suficiente se não for complementada com uma participação ativa dos cidadãos no processo comunicacional político, ele apresenta uma visão parcial e negativa da internet como instrumento político no qual, afirma Honneth, existe uma quantidade imensa de espaços públicos digitais de muito diversos tipo e durabilidade, com limites de adesão não claramente definidos, em sua maioria em inglês, sem funções de controle, com membros anônimos. Em suma, a internet oferece um âmbito para “opiniões individuais apócrifas e antidemocráticas e para movimentos grupais” (Honneth 2011, p. 562 tradução nossa). O absenteísmo e o ceticismo mediáticos que Honneth recrimina em Arendt e Habermas reaparece, assim, em seu próprio pensamento frente às tecnologias da comunicação digital.

É muito difícil acreditar que para Honneth a internet possa ser concebida como originando uma nova mudança estrutural da publicidade democrática que conduza a uma nova autocompreensão da ação moral dos indivíduos e de suas instituições. A internet está antes relacionada, para Honneth, com processos políticos transnacionais e com a possibilidade de criar espaços públicos críticos (“Gegenöffentlichkeit”) frente a governos não democráticos (Honneth, 2011, p. 564 tradução nossa).

No caso de regimes democráticos, ele acredita que as “tenções centrífugas” deste meio provocam um deslocamento do intercâmbio democrático para além dos limites do estado nacional em foros e redes interativas que não estão limitadas temporal e espacialmente, tendo como resultado um desmembramento da esfera pública e das energias solidárias necessárias para a formação de uma vontade comum. Em outras palavras, a expansão ilimitada da internet teria “um efeito paradoxal que seria o de destruir, ou pelo menos enfraquecer, a cultura política nas democracias maduras [...]” (Honneth, 2011, p. 565 tradução nossa).

Mais ainda, a rede digital poderia provocar um enfrentamento entre um espaço público transnacional e os processos de formação de objetivos comuns no âmbito nacional. Honneth acredita que as comunidades de elites cosmopolitas enfraqueceriam ainda mais os grupos nacionais marginalizados, pois essas comunidades teriam mais “liberdade social”, mas tais grupos teriam menos acesso a informações e temas relevantes.

Esta oposição, assim concebida por Honneth, não é convincente. Não apenas porque a internet permite que os grupos marginalizados tenham um acesso a informações, mas também porque a rede lhes permite criar suas próprias redes de interesses. A dimensão da comunicação transnacional de modo algum implica necessariamente que as discussões democráticas nacionais se enfraqueçam, ao contrario, como mostram, por exemplo, as sinergias dos movimentos políticos recentes no mundo árabe, algo que o autor também reconhece. Honneth pensa em categorias dos meios de comunicação de massa capazes de criar uma opinião pública homogênea e controlada, baseada nos canais públicos de rádio e televisão, à qual corresponde uma ação democrática concebida como um processo limitado e controlado de formação e informação da opinião pública. É difícil compactuar com esta visão parcial e negativa da internet se se pensa nos debates em torno ao tema da democracia digital ou à importância da rede digital, por exemplo, no campo da administração pública e de sua relevância na discussão e ação pública nos âmbitos local e nacional. Basta pensar no acesso móvel à rede baseado na transformação do telefone clássico em complexos aparelhos digitais com todo tipo de aplicativos sociais, algo que contradiz a percepção de Honneth de indivíduos fisicamente isolados frente ao computador.

Os debates nacionais tampouco podem ser separados dos transnacionais e os grupos que se constituem, por exemplo no Facebook sob a rubrica “amizade”, têm uma inesperada influência política não menor que a dos blogs. Honneth acredita, assim como Habermas, em uma comunidade política ideal de seres racionais que discutem argumentos sem pressões do poder e, na medida do possível, sem intermediação midiática com a finalidade de alcançar um consenso sobre objetivos e valores para uma ação comum no marco do estado-nação.


Informação e ação moral na era digital


Esta visão da relação entre liberdade e sociedade sofre de uma percepção limitada da realidade e possibilidades que a internet oferece atualmente e no futuro para os processos políticos e a vida social em geral, tanto no plano nacional quanto no internacional. Honneth vê o aspecto comunicacional como um fenômeno essencialmente unitário e unificador e não como articulação de diversos tipos de comunidades e comunicações mediatizadas por tecnologias de comunicação digitais interativas com forças centrífugas e centrípetas. Honneth se interroga sobre o direito à liberdade, sendo também consciente que dito direito é algo “relativamente estável” e está baseado em um “sistema de intenções habituais” (Honneth, 2011, p. 92), isto é, em uma moral ou ethos da qual surgem as instituições e regras que criam o estado de direito.

Mas o que Honneth aparentemente não percebe é que a ideia da eticidade democrática, e com ela a “realidade da liberdade”, se realiza atualmente no horizonte da digitabilidade, tanto nos casos dos processos estritamente políticos, quanto no caso de outras formas de vida social, como as relações pessoais (amizade, intimidade, família) e econômicas (mercado, consumo, trabalho). Se o espaço comunicacional é o núcleo da democracia, está claro que, quando ocorre uma transformação comunicacional como a que vivemos atualmente com os meios digitais interativos, estes levam a uma transformação das relações sociais e da relação entre o ser humano e o mundo, isto é, a uma nova forma de ser-no-mundo e, em particular, de ação moral no sentido da responsabilidade social, que é o fundamento das instituições que sustentam a vida social.

O paradigma dos meios de comunicação de massa como fundamento da vida social não apenas se enfraqueceu desde a implantação da internet, mas também foi questionado e, embora não substituído, perdeu o lugar que ocupava anteriormente por não ser interativo. Os esforços dessas mídias para mostrar-se interativas são uma prova das transformações comunicacionais que vivemos atualmente.

É paradoxal que um paradigma como o dos meios de comunicação de massa tenha sido pensado como algo fundamental para o processo democrático, enquanto que a rede digital interativa traria efeitos antidemocráticos. Com certa ironia, poderíamos dizer que os meios de comunicação de massa são católicos, enquanto a internet opera uma reforma luterana mediática que permite aos agentes, individuais ou sociais, interpretar por si mesmos o mundo em que vivem e não apenas distribuir, mas também partilhar as referidas interpretações sem passar por um processo de aprovação centralizada baseada no “nihil obstat”, “imprimi potest” e “imprimatur”[2].

A partir de uma visão retrospectiva da referida reforma midiática se pode constatar que em sociedades que passaram por sistemas centralizados de distribuição de mensagens cresceu um forte desejo social de libertar-se do referido paternalismo informacional e comunicacional. No ensaio “Missão do Bibliotecário”, Ortega y Gasset indica que as profissões surgem com base nas necessidades sociais, as quais são de caráter histórico. O Renascimento é a época em que, segundo Ortega y Gasset, surge uma grande necessidade social do livro, culminando com a Revolução Francesa. Escreve Ortega y Gasset:

A sociedade democrática é filha do libro, é o triunfo do livro escrito pelo homem escritor sobre o livro revelado por Deus e sobre o livro das leis ditadas pela autocracia. (Ortega y Gasset, 1976, p. 33. Ver Capurro, 2000)

Mutatis mutandis podemos dizer que a democracia digital é filha da internet. Esta última é o triunfo da comunicação digital pelo homem comunicacional sobre as mensagens distribuídas hierarquicamente “de uns para muitos” pelos meios de comunicação de massa.

Lembremos que para Kant a autonomia do sujeito como fonte crítica do saber está baseada, por um lado, na possibilidade de pensar e expressar-se para além dos limites impostos por um cargo oficial ou “público”. Isto é denominado por Kant, na obra “Resposta à pergunta o que é a Ilustração?”, o “uso privado da razão” em oposição ao “uso público”, isto é, o uso da razão além dos limites impostos por um cargo oficial quando pensamos por conta própria (Kant, 1975a, A 488, p. 57). Assim, o uso público da razão é aquele que efetuamos quando agimos como agentes autônomos que se abrem ao universo de possíveis leitores e críticos de nosso saber. O sujeito autônomo é, para Kant, um sujeito que passa suas ideias para os outros sujeitos e o faz ao mesmo tempo em que é capaz de receber as ideias dos outros sem os limites impostos por um cargo que “privatizam” a liberdade.

Sua autonomia é indissociável desta heteronomia ou interdependência social universal. Mas para que este livre pensar possa ocorrer não basta dizer que as ideias são livres e que cada um pode pensar o que quer. Este idealismo não percebe a relação entre pensamento e meios de comunicação, como diz Kant muito claramente no opúsculo “O que significa orientar-se no pensamento?” quando escreve:

Frequentemente se diz que o poder superior nos pode privar da liberdade de falar ou de escrever, mas não da liberdade de pensar. Mas quanto e com quanta exatidão pensaríamos se não o fizéssemos em companhia de outros a quem pudéssemos comunicar-lhes nossos pensamentos e eles os seus! (Kant 1975b, A 325, p. 280)

Por isso acrescenta Kant (ibidem, (tradução de Capurro. Ver Capurro 2000a) que:

[...] quem nos priva da liberdade de comunicar publicamente nossos pensamentos aos outros nos priva também da liberdade de pensar, sendo esta o único tesouro que resta em meio aos cargos públicos e a única que pode nos proporcionar um conselho frente a todos os males dessa situação.

Adaptando esta colocação a nossa situação atual, significa que um governo ou um poder público que impeça o acesso e uso livre da internet é um governo ou poder que nos priva da liberdade de pensar informando-nos mutuamente e, portanto, de agir moralmente.

A ação moral é aquela que não se deixa coagir pelos limites impostos por cargos públicos, mas que se abre desde seu foro íntimo, ou privado, a um diálogo público entre os seres livres que se sabem falíveis enquanto condicionados basicamente pelos limites da razão humana e não por censuras que os impeçam de assumir a responsabilidade de ser, pensar e agir com responsabilidade própria. Este ser livre a que me referia inicialmente é visto hoje implicado no horizonte da digitabilidade em todos os níveis da vida social.

A interação entre sujeitos autónomos é o ponto central da luta pelo reconhecimento descrita por Hegel e retomada por Honneth. Está luta é “de vida ou morte” (“Kampf auf Leben und Tod”) porque as autoconsciências aspiram a um mútuo reconhecimento enquanto tais, isto é, para além de todo condicionamento vital concreto (Hegel, 1975, p. 149). Aqui se manifesta o idealismo hegeliano que imagina autoconsciências afastadas do mundo fazendo deste um mero cenário da passagem e retorno a si mesmo do espírito absoluto. A autoconsciência assim entendida é, em termos heideggerianos, o sentido do ser para Hegel. Por isso é que a relação entre as autoconsciências é concebida como “luta” (“Kampf”) para além da vida biológica e do próprio mundo. Tal luta é concebida por Hegel como uma experiência não apenas com outra autoconsciência, mas também com “o medo da morte, senhora absoluta” (“die Furcht des Todes, des absoluten Herren”) (Hegel 1975, p. 153 tradução nossa). Sem poder iniciar agora uma crítica da ontologia hegeliana, quero indicar que a concepção da relação entre autoconsciências como uma luta de vida ou morte tem um sentido forte apenas no interior da referida ontologia, na verdade uma metafísica porque pressupõe e indica no espírito absoluto uma dimensão para além da morte. Quando Honneth parte da autonomia e da luta pelo reconhecimento, ele herda tal metafísica sem questioná-la. Além de um esquecimento quase total da tecnologia da comunicação digital em sua análise da realidade social, Honneth esquece a pergunta sobre o ser no sentido heideggeriano. As autoconsciências não existem fora de um mundo originariamente compartilhado. A autoconsciência que se pensa autônoma sustentada implicitamente pelo espírito absoluto o faz sempre desde uma heteronomia ontológica na qual desempenha primariamente seu ser próprio como alguém que existe-no-mundo. O mútuo reconhecimento é um jogo de liberdades finitas e, portanto, heterônomas, que dizem respeito não a um espírito absoluto, mas a seu ser-no-mundo compartilhado em um processo de possibilidades de ser. Por isso é que o sentido do ser e, em particular, de ser alguém no mundo, não é fixo, mas histórico, uma vez que não depende de sujeitos plenamente autônomos. Denomino angelética a concepção fenomenológica de ser humano como mensageiro ou, retomando o termo passagem, como passageiro da mensagem de um mundo compartilhado (Capurro; Holgate, 2011). O ser não é, então, o ser da metafísica, uma espécie de substituto neutro de Deus, mas o horizonte de possibilidade de agir a que estão expostos aqueles que compartilham o mundo com outros. Nosso ser-no-mundo é um estar-no-mundo[3], isto é, um ser provisório em um jogo de mútuo reconhecimento sem fundamento que experimentamos como jogo quando nos arriscamos não à luta, mas ao “salto” (“Satz”)[4] que abre nossas identidades à diferença que marca nosso estar e nos reúne em torno a normas e valores aceitos e compartilhados. A compreensão do ser que nos chama a pensar, retomando o título das aulas de Heidegger (1971), em la época atual, é a digitabilidade[5]. Compreendemos hoje o ser dos entes, incluindo nosso próprio ser, quando o interpretamos no horizonte da digitabilidade.

Denomino ontologia digital a referida compreensão do ser, o que não significa nem que os entes sejam digitais, isto é, que os átomos sejam bits, nem que o horizonte da digitabilidade seja o único verdadeiro e definitivo e, ainda menos, que nosso “ser alguém” se esgote em suas expressões digitais. O primeiro caso se trata de uma metafísica ou de um pitagorismo digital, no segundo e no terceiro casos, trata-se de uma ideologia muito difundida atualmente (Capurro, 2011). O “salto” desde a metafísica ou a ideologia à ontologia é um salto ético. A pergunta “quem somos?” nos marca como passageiros ou mensageiros para quem o chamado ontológico é originalmente um chamado ético (Capurro; Holgate, 2011). Nele estão em jogo as possibilidades de vida com os outros em um mundo compartilhado no horizonte das tecnologias digitais de comunicação.

Quem somos? Esta pregunta faz parte de um sem número de ações e opções que marcam a vida individual e social assim como as instituições e leis e formas de interação com elas e a partir delas. É isto o que permite que sejamos simultaneamente, tanto individual como socialmente, e globalmente cada vez mais, um “quem” único e específico, mas de modo algum fixo ou absoluto.

Tampouco a liberdade individual é algo dissociado da “liberdade social”, mas a liberdade individual, como conjunto de opções, sempre se dá em relação a outros seres em um mundo comum. Somente assim é possível conceber leis, normas e valores comuns, afirmando ao mesmo tempo opções singulares em situações históricas determinadas que marcam nossas identidades e enriquecem a variedade humana.

A formação de identidades humanas é um jogo comum ou um “interplay”, como o denomina o filósofo australiano Michael Eldred, e não primariamente uma luta, a qual pode ser vista como uma forma, frequentemente violenta ou de “vida ou morte”, do jogo das liberdades (Eldred, 2008). O direito à liberdade baseado em princípios, valores e instituições surge a partir da dimensão do jogo própria da liberdade sempre precária do jogador humano em sua capacidade de responder ao chamado do outro.

Esta concepção heterônoma da liberdade humana como resposta e responsabilidade frente ao outro está no centro do pensamento ético de Emmanuel Lévinas (Capurro, 1991). O jogo do mútuo reconhecimento é a ação moral originária, sendo o referido jogo, como aponta o filósofo Eugen Fink, um “símbolo do mundo” (“Weltsymbol”). Nele se refletem as dimensões de falta de fundamento (“Grundlosigkeit”), falta de sentido (“Sinnlosigkeit”) e falta de objetivo (“Zwecklosigkeit”) características da rapidez do jogo (Fink 2010, p. 221 tradução nossa). “O ser humano é um jogador” (“der Mensch ein Spieler”) escreve Fink (ibid. tradução nossa), isto é, alguém que transmite uma mensagem em um jogo sempre enquadrado pelas regras, leis, valores e instituições descritas por Honneth, mas hoje pensadas não a partir da metafísica kantiana da autonomia e a luta hegeliana pelo reconhecimento, mas a partir de um horizonte ontológico digital.


Conclusão

Quem somos hoje? O jogo social implica uma variedade de posibilidades entre autenticidade e inautenticidade que se colocam hoje no horizonte digital e diferem, por exemplo, das possibilidades abertas pela imprensa, a assim chamada “galáxia de Gutengerg” (McLuhan) ou pelos meios de comunicação de massa do século passado.

As tecnologias de comunicação digital transformam o sujeito moderno supostamente autônomo em um global player, que frequentemente se acredita livre de regras a não ser aquelas ditadas por seus interesses particulares. Estamos ainda nos primórdios de uma discussão ética e legal em que a informação, a ação moral e as tecnologias da comunicação digital se entrelacem em um ethos e um direito comunicacional global como jogo de liberdades responsáveis. Não é por acaso que no momento em que as referidas tecnologias possibilitam uma transparência da “publicidade” (“Öffentlichkeit”) ou do espaço público a que aspiraram os filósofos da Ilustração, dita possibilidade provoca ultimamente uma discussão virulenta sobre a privacidade, termo ausente no livro de Honneth, embora seu pensamento sobre a autonomia o inclua implicitamente.

A identidade e a autonomia são praticadas hoje em redes sociais digitais, em blogs e no uso das tecnologias de comunicação em contextos econômicos, trabalhistas e políticos. A diferença entre o público e o privado é uma diferença básica de toda vida social humana (Capurro, Rafael; Capurro, Raquel 2011; Capurro et al. 2013). Ela não é estável ou definitiva. Não pode ser fixada abstratamente e tampouco é algo que possa ser definido ou identificado como uma propriedade de alguma coisa ou de alguém. É uma diferença de segunda ordem, ou seja, o que é privado ou público depende do contexto ou jogo sociocultural no qual algo ou alguém se manifesta. Meu nome e endereço podem ser algo público ou privado em diferentes contextos. Helen Nissenbaum mostrou recentemente os conflitos próprios de manifestar o privado em público e a necessidade de pensar eticamente ambos âmbitos com base no que ela denomina “integridade contextual” (Nissenbaum, 2010), sempre impregnada de tradições culturais. Isso torna difícil a fixação de princípios e leis de proteção de dados e definir a priori o que pode ser entendido como público ou privado se forem preteridos os contextos ou jogos sociais e as liberdades individuais subjacentes. O jogo relativamente livre com identidades digitais, por exemplo em redes sociais como o Facebook, mostra claramente que a diferença público/privado depende das possibilidades oferecidas pela referida plataforma para traçar pessoalmente tal diferença. Mas esta diferença significa algo distinto desde a perspectiva dos proprietários da plataforma, cujo objetivo não é o de possibilitar a aquisição de amigos, isto é, a busca e obtenção de reconhecimento através de algo simples, e ao mesmo tempo tão problemático, como o ícone “curtiu”. O que a plataforma ou, melhor dizendo, seus proprietários querem é, simplesmente, ganhar dinheiro, sendo isto, por sua vez, uma forma de reconhecimento.

Nenhuma sociedade humana pode basear-se na transparência ou no espaço público total ou na pura opacidade ou segredo (Capurro e Capurro 2007). A razão desta dupla negação é o fato de que o mundo humano consiste em um jogo de liberdades finitas que é, portanto, um mundo de riscos no jogo ético do reconhecimento. A moral, não menos que as leis, oferecem ao indivíduo e à sociedade uma base mais ou menos estável de regras do jogo.

A internet não possui ainda uma constituição sui generis en forma de um ethos digital à qual adiram livremente indivíduos e sociedades. Uma das tarefas futuras da Ética da Informação consiste em problematizar a relação entre informação e ação moral no contexto das tecnologias digitais da comunicação a fim de poder conceber e realizar dito ethos. Os primeiros passos foram dados nos World Summit on the Information Society 2003 / 2005.

 


[1] Sempre que cito textualmente a Honneth se trata de minha tradução.

[2] Literalmente: “nada impede”, “pode ser impresso” e “deixem-no ser impresso”. Trata-se de expressões latinas utilizadas pela Igreja Católica para autorizar a impressão de obras cujo conteúdo estivesse em conformidade com a doutrina católica. Esta prática pode ser considerada uma espécie de censura prévia. (Nota da tradutora).

[3] Sobre a tradução de “Sein” (ser) como “estar”, ver meu ensaio (Capurro 2011).

[4] Refiro-me aqui ao duplo sentido da palavra “Satz”, como proposição ou princípio e como salto, com o qual joga Heidegger (1976).

[5] Ver meus textos e traduções “En torno a Heidegger“ (Capurro, 2011).


Bibliografía


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Ultima modificación: 26 de agosto de 2017

 
 
     

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